Stent com polimeros vs. sem polimeros em pacientes com alto risco de sangramento - estudo ONYX one
Stent com polimeros vs. sem polimeros em pacientes com alto risco de sangramento - estudo ONYX one

06/03/2020, 18:41 • Atualizado em 21/12/2023, 17:30

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Revisor:

  • Fernando Bernardi

Fundamentação: Na prática clínica, uma grande parte dos pacientes submetidos a intervenção coronariana percutânea (ICP) apresentam alto risco de sangramento. A utilização de dupla antiagregação plaquetária (DAPT) é recomendada por pelo menos 6 a 12 meses após implante de um stent farmacológico (ou eluidor de fármaco) para evitar o risco de trombose de stent.

Até recentemente, uma estratégia frequentemente adotada em pacientes de alto risco de sangramento era o implante de stents não-farmacológicos seguido de interrupção da DAPT em 1 mês. No entanto, como esperado, estes indivíduos apresentavam um risco elevado de necessidade de revascularização, principalmente as custas de reestenose de stent. Em 2015, o estudo LEADERS FREE, demonstrou superioridade de um stent farmacológico sem polímero (BioFreedom) contra stents não-farmacológicos em pacientes submetidos a ICP e de alto risco de sangramento, onde a DAPT foi interrompida em 1 mês [2].

No presente estudo, os autores compararam um stent farmacológico com polímero de segunda geração (stent eluidor de zotarolimus – Resolut Onyx) contra o stent BioFreedom na mesma estratégia de interromper DAPT em 1 mês também em pacientes de alto risco de sangramento1.

Metodologia: Estudo multicêntrico, randomizado, unicego, onde foram comparados os stents Resolut Onyx vs. BioFreedom em pacientes de alto risco de sangramento submetidos a ICP e com interrupção de DAPT em 1 mês, seguido de utilização de apenas um agente antiplaquetário. O desfecho primário de segurança foi um composto de morte cardiovascular, infarto agudo do miocárdio (IAM) e trombose de stent em 1 ano. O desfecho secundário principal de efetividade foi um composto de morte cardiovascular, IAM da lesão-alvo tratada e revascularização da lesão-alvo clinicamente indicada. Ambos desfechos foram testados para não inferioridade com uma margem de 4,1 pontos percentuais para o desfecho primário e 4,4 pontos percentuais para o desfecho secundário principal tendo um poder estatístico de pelo menos 90%.

Principais Resultados: No total 1996 pacientes de alto risco de sangramento foram randomizados 1:1 para os dois tipos de stents (1003 pacientes para o Resolute Onyx e 993 para o BioFreedom). As principais características de alto risco de sangramento foram idade > 75 anos (~61,5%) dos casos e necessidade de concomitante de um anticoagulante (~38,5%). Nestes casos de pacientes em uso de algum anticoagulante, a estratégia era DAPT mais o anticoagulante ou apenas um único antiagregante mais o anticoagulante por 1 mês, a critério do médico assistente, seguido de um antiagregante mais o anticoagulante até 1 ano. Em 1 anos, o desfecho primário ocorreu em 17,1% dos pacientes no grupo Resolute Onyx e 16,9% no grupo BioFreedom (diferença de 0,2 pontos percentuais com limite superior do intervalo de confiança unilateral de 97,5% de 3,5 para uma margem de não-inferioridade de 4,1; p=0,01 para não-inferioridade).

Para o desfecho secundário principal de eficácia, no grupo Resolute Onyx ocorreu uma taxa de 17,6% de eventos contra 17,4% no grupo BioFreedom (diferença de -0,2 pontos percentuais com limite superior do intervalo de confiança unilateral de 97,5% de 3,5 para uma margem de não-inferioridade de 4,4; p=0,007 para não-inferioridade).

Conclusões: Em pacientes de alto risco de sangramento submetidos a ICP com estratégia de DAPT por apenas 1 mês após o procedimento, a utilização de um stent farmacológico com polímero (Resolute Onyx) foi não inferior a utilização de um stent farmacológico sem polímero (BioFreedom) quanto a eventos de segurança e eficácia em 1 ano de seguimento.

Comentários: A utilização de stents farmacológicos (ou eluidores de fármaco) em pacientes de maior risco de sangramento sempre é um dilema na nossa prática clínica. A presença da droga antiproliferativa tem como objetivo combater a hiperproliferação endotelial que é a causadora da reestenose de stent, cuja incidência pode variar de 10-30% nos stents metálicos não-farmacológicos. No entanto, como efeito indesejado, as drogas retardam a endotelização das estruturas metálicas dos sents. O contato das estruturas metálicas com os componentes sanguíneos é o principal substrato para a temida trombose de stent, sendo este o racional para as recomendações de se manter DAPT por um período mais prolongado quando um stent farmacológico é implantado.

Com o advento da segunda geração dos stents farmacológicos, onde houve avanços tecnológicos que permitiram estruturas metálicas mais finas, liberação mais controlada dos fármacos e polímeros (componentes carreadores do fármaco) mais biocompatíveis, observou-se uma redução expressiva das taxas de trombose de stent em comparação aos stents farmacológicos de primeira geração (Cypher e Taxus). Nos últimos 5 anos, inúmeros estudos têm demonstrado ser seguros reduzir a DAPT para 3-6 meses com os novos stents farmacológicos, no entanto o presente estudo é o primeiro ensaio clínico que testou uma redução ainda maior da duração de DAPT com estes dispositivos. E para tal, os autores utilizaram como controle um stent farmacológico que tem uma característica peculiar (BioFreedom), que é o fato dele não possuir um polímero carreador da droga. Esse stent tem uma tecnologia onde o farmáco é diretamente eluido na sua estrutura metálica, eliminando um dos componentes possivelmente relacionados com eventos indesejados, que são os polímeros.

Como já mencionado, em 2015 o estudo LEADERS FREE já havia demonstrado superioridade do BioFreedom versus stents não-farmacológicos numa estratégia de interrupção da DAPT em 1 mês. Desde então, esse stent se tornou o dispositivo de escolha em situações de pacientes de alto risco de sangramento onde a interrupção da DAPT mais precoce era desejada.

O presente estudo demonstrou equivalência (sem demonstrar superioridade) dos resultados de segurança e eficácia de um stent farmacológico com polímero de segunda geração versus o BioFreedom, com taxas de eventos praticamente idênticos entre os grupos. Contudo, algumas questões devem ser levantadas. A primeira é, como se tratou de um estudo de não-inferioridade, qual seria a vantagem então de se optar por um stent farmacológico com polímero ao invés do stent BioFreedom? Na opinião do revisor, a principal vantagem é aumentar o arsenal terapêutico, permitindo uma disputa de mercado neste nicho de pacientes cada vez mais presentes na nossa prática clínica, possibilitando a redução dos elevados preços dos stents farmacológicos.

Um segundo questionamento é se os resultados observados com este stent (Resolute Onyx) podem ser extrapolado para os outros stents farmacológicos com polímero de segunda geração, uma vez que todos os atuais dispositivos no mercado apresentam performances muito semelhantes. Esta é uma questão bastante controversa, mas a priori, idealmente outros estudos semelhantes com os demais stents deveriam ser conduzidos para uma resposta definitiva. No entanto, eu acredito que uma vez que estes estudos sejam conduzidos, eu apostaria que a performance seria muito semelhante entre os demais stents, principalmente com os dispositivos mais modernos, cujas hastes metálicas são ainda mais finas. E por último, outro questionamento relevante é, será que os resultados não teriam sido melhores se houvesse um terceiro grupo controle neste estudo onde a DAPT tivesse sido mantida por 3-6 meses, mesmo nesses pacientes com maior risco de sangramento? É importante observar nesse estudo que os pacientes não só eram de alto risco de sangramento, mas também de alto risco de eventos isquêmicos.

Eram pacientes com idade média mais alta do que a maioria dos estudos de revascularização (74 anos), muitos diabéticos (38%), na metade dos casos a apresentação clínica foi Síndrome Coronariana Aguda e as lesões tratadas eram anatomicamente complexas. Isto ficou evidente com a alta taxa de eventos em 1 ano observada no estudo (8% de mortalidade, 14% de IAM e 5% de sangramento grave em 1 ano). Então, fica a dúvida se o benefício clínico líquido (net clinical benefit) não poderia ter sido melhor caso a DAPT tivesse sido mantida por mais tempo, independente do tipo de stent implantado.

Impacto Clínico na Opinião do Revisor: Apesar destes questionamentos, eu acredito que o resultado do estudo é de grande valia para a nossa prática clínica, principalmente naquelas situações onde temos um paciente que recebeu um stent farmacológico, e que por algum motivo precisa ter a DAPT interrompida, como por exemplo na necessidade de uma cirurgia não programada. Estes dados nos dão um pouco mais de segurança nessas situações muitas vezes imprevisíveis. No entanto, como uma forma geral, ainda vejo a necessidade de se manter a DAPT por um tempo maior (3-6 meses) mesmo nos pacientes com risco mais elevado de sangramento. Um ensaio clínico randomizado propriamente desenhado é imperativo para melhor elucidar essa questão.

Referências:

  1. Windecker S, Latib A, Kedhi E, Kirtane AJ, Kandzari DE, Mehran R, et al. Polymer-based or Polymer-free Stents in Patients at High Bleeding Risk. N Engl J Med. 2020;1–11.
  2. Urban P, Meredith IT, Abizaid A, Pocock SJ, Carrié D, Naber C, et al. Polymer-free drug-coated coronary stents in patients at high bleeding risk. N Engl J Med. 2015;373(21):2038–47.
  3. #doenca_coronariana_estavel

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